quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Desafios da Contextualização no Sertão Nordestino

Quando se fala em contextualização no sertão nordestino, em especial ao que se refere à evangelização e culto, o que primeiro pode vir a nossa mente é o uso de elementos da nossa cultura como ferramenta de comunicação. E sendo o nordeste uma região de uma riqueza e diversidade cultural como poucas no mundo, temos aí “muito pano para as mangas”! De fato, se tratando de elementos culturais, Deus foi especialmente generoso com o nordeste brasileiro.
Você seria capaz de relacionar os ritmos pernambucanos? Difícil contar sem ter que usar os dedos das mãos, não é mesmo? Então, se levarmos em consideração que somos nove estados, que cada estado tem suas muitas peculiaridades culturais e que cultura não é só música, torna-se impossível enumerar os costumes, os folguedos, a culinária e tudo o mais que é componente da cultura nordestina; teríamos que fazer um extenso trabalho de pesquisa.

Cultura X Pecado

Antes de tudo, porém, é preciso que entendamos que o Evangelho veio para separar o homem do pecado e não da sua cultura (exceto naquilo que ofenda a santidade). Caso contrário o Jesus-Homem, durante seus dias entre nós, teria uma “figura celeste”, iguais as que nós vemos representadas nas peças teatrais em nossas igrejas (já reparou que nestes episódios Ele sempre é representado como aquele que se veste todo de branco e com um manto escarlate?).

Mas, historicamente, Jesus era um personagem que diferia dos seus conterrâneos? Será que sua comida era diferente, sua bebida, suas roupas, as músicas que ele cantava, as festas que frequentava eram diferente daquilas habituais da sua época, do seu contexto? Claro que não! A tarefa de Judas entregar Jesus teria sido mais fácil caso não fosse necessário um beijo para diferenciá-lo.
Jesus vivia absolutamente inserido em seu contexto cultural, e talvez por isso, hoje Ele não fosse bem aceito no meio de algumas comunidades cristãs.

Da mesma forma, e certamente por um motivo mais óbvio, o contexto cultural sertanejo seja, de certo modo, rejeitado na evangelização e nos cultos e tido como pecado por diversas vezes.
Ainda há no meio evangélico quem confunda cultura com pecado. Existem aqueles que vestem Jesus de branco e com uma manta escarlate e tentam fazer da fé em Cristo sua cultura, vivendo a utopia de um “ambiente sacro”, desprovido de influências culturais (como se pudesse), ignorando que assim como não somos isentos ao pecado, o homem enquanto ser social não pode estar alienado da sua cultura.

O Desafio

Quando começou esta rejeição a contextualização no sertão nordestino? Porque tratá-la como “desafio”, como sugere o tema deste capítulo?

A história nos mostra que os nossos missionários pioneiros vieram trazendo na bagagem a Bíblia e sua cultura. A Bíblia eles pregaram com zelo e abnegação, a cultura impuseram com rigor. De forma que assimilamos com sacro aquilo que era da cultura deles (americanos e ingleses), enquanto que repudiamos e endemonizamos o que era nosso.

Sem contar que nós viemos de uma tradição religiosa que também não estava aberta a contextualização, posto que o Brasil, em sua maioria é de origem Católica Apostólica Romana, tem a mesma história de resistência a nossa cultura. Que, por isso, por exemplo, adotou por um bom tempo como língua para as suas liturgias - o sacro latim. Talvez porque o nosso português fosse vulgar demais para que Deus viesse a se comunicar através dele! Some a estes fatores, o preconceito que os sertanejos sofrem. Tudo o que é do nordeste, geralmente, é tido por muitos como pobre e vulgar. - Ridículo!! Diriam alguns.

Os missionários pioneiros já foram há bastante tempo, as missas católicas já não são mais em latim e a cultura sertaneja já não é mais alvo de tanta discriminação (criaram até o “forró universitário” – chique, não?).

Mas, por incrível que pareça, em nossa caminhada com a Banda Sal da Terra, ainda encontramos quem repudie nossos instrumentos musicais. Zabumba então, tadinha, tem gente que jura que ela é do capeta! Neste sentido contextualização ainda é um desafio, e temos consciência que em alguns ambientes litúrgicos não somos bem vindos por conta do nosso jeito nordestino de ser.

A Dúvida

Contextualização não é só um desafio, pode ser também uma dúvida. Por um bom tempo nós, que fazemos o Sal da Terra e que sempre lançamos mão da contextualização como ferramenta de comunicação, tivemos dúvida. Às vezes pessoas que sempre tivemos como referência nos alertavam:

- Cuidado! Não é bem por aí; ou, mais objetivamente, isso não é de Deus!.

Se por um lado a gente via Deus agir e colhia os frutos do Evangelho pregado com auxílio da contextualização, por outro tínhamos dúvida. Havia uma força, um tradicionalismo arraigado naquilo que não era nosso, fundamentado numa cultura que era estranha para nós, mas aceito como correto por tanta gente boa (inclusive por líderes que sempre respeitamos).

Com a maturidade, com a reflexão bíblica e com os frutos, finalmente veio a confirmação:

Papa-Capim (2002)

Quando a Cristo abracei
Dei de mão para o pecado
Vida velha eu deixei
Por Jesus fui transformado.
Só não deixei minha terra (pé de serra)
Minha “caqueira de fulô”
Meu carro de boi, arado
Eu num deixei não “sinhô”

Refrão

Num “arrepare” se eu louvo
De um modo diferente
Se além de nordestino
Em Nosso “Sinhô” sou crente
Quando Cristo me salvou
Me libertou da iniquidade
Mas, minha cantoria minha terra
Não é imoralidade

Meu chapéu de couro eu acho elegante
A perneira, o gibão
Já o paletó eu acho apertado
Não me sinto bem nele não
E eu não quero arremedar
O sotaque americano
Eu nasci foi no Nordeste
Sou cristão pernambucano

Refrão

Hoje eu sou missionário – pregador
Do Evangelho de Jesus
Sigo ao meu povo mostrando
O Caminho, o Amor e a Luz
Sempre ao lado meu Mestre
Vou cantando o meu baião
Bendizendo o seu santo nome

Com amor e devoção.

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